UM BLOG PEDAGÓGICO E CULTURAL A SERVIÇO DE ESTUDANTES, PROFESSORES, PESQUISADORES E INTERESSADOS EM GERAL.



quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

SOCIALIZAÇÃO.

Contatos sociais
Ao dar uma aula, o professor entra em contato com seus alunos. O cliente e o vendedor de uma loja estabelecem contato na hora da venda de uma mercadoria, Duas pessoas conversando também participam de um contato social. A convivência humana pressupõe uma grande variedade de tipos de contatos sociais. Você mesmo pode se relacionar de diversas formas, por exemplo, pela maneira como adquire seus livros escolares, ou pelos contatos sociais que manteve para chegar até a atual etapa de sua educação formal.
O contato social está na origem da vida em sociedade. É o primeiro passo para que ocor­ra qualquer associação humana. Por meio dele, as pessoas estabelecem relações sociais, criando laços de identidade, formas de atuação e comportamento que são a base da constitui­ção dos grupos sociais e da sociedade.
.
Tipos de contatos sociais
Existem dois tipos de contatos sociais: pri­mários e secundários.
.
Contatos sociais primários. São os con­tatos pessoais, diretos, e que têm uma forte base emocional, pois as pessoas envolvidas compartilham suas experiências individuais. São exemplos de contatos sociais primários: os familiares (entre pais e filhos, entre irmãos, en­tre marido e mulher); os de vizinhança; as rela­ções sociais na escola, no clube etc. As pri­meiras experiências do indivíduo se fazem com base em contatos sociais primários.
 
.
Contatos sociais secundários. São oscontatos impessoais, calculados, formais. Dois exemplos: o contato do passageiro com o co­brador do ônibus para pagar a passagem; o contato do cliente com o caixa do banco para descontar um cheque. São também conside­rados secundários os contatos impessoais mantidos por meio de carta, telefone, telegra­ma, e-mail etc.
 Oliveira, P. S. de. FUNDAMENTOS SOCIOLÓGICOS. São Paulo: Ed. Ática, 2010, p. 98.

CIÊNCIAS SOCIAIS E SUA DIVISÃO.


As Ciências Sociais

O comportamento humano é muito com­plexo e diversificado. Cada indivíduo recebe in­fluências de seu meio, forma-se de determina­da maneira e age no contexto social de acordo com sua formação. O indivíduo aprende com o meio, mas também pode transformá-lo em sua ação social.

Há comportamentos estritamente indivi­duais - como andar, respirar, dormir - que se originam na pessoa enquanto organismo bio­lógico. São comportamentos estudados pelas Ciências Físicas e Biológicas. Por outro lado, receber salário, fazer greve, participar de reu­niões, assistir aulas, casar-se, educar os filhos são comportamentos sociais, pois se desen­volvem no contexto da sociedade.

Ao longo da História, a espécie humana tem organizado sua vida de forma grupal, As Ciências Sociais pesquisam e estudam o com­portamento social humano e suas várias for­mas de manifestação.

 Entender a sociedade em que vivemos

Pode-se dizer que as Ciências Sociais caracterizam-se pelo estudo sistemático do comportamento social do ser humano. Dessa forma, o objeto das Ciências Sociais é o ser humano em suas relações sociais.

Ao mesmo tempo, as Ciências Sociais tem por objetivo ampliar o conhecimento sobre o ser humano em suas interações sociais e estudar a ação social em suas diversas dimensões. Ao realizar esse objetivo, as Ciências Sociais con­tribuem para um melhor entendimento da so­ciedade em que vivemos, fornecendo instru­mentos que podem ajudar a transformá-la.

Disciplinas em que se dividem as Ciências Sociais

Com o avanço do conhecimento da so­ciedade, tornou-se necessária a divisão das Ciências Sociais em diversas áreas de conhe­cimento, de modo a facilitar a sistematização dos estudos e das pesquisas. Essa divisão abrange atualmente as seguintes disciplinas:

Sociologia - Estuda as relações sociais e as formas de associação, considerando as in-terações que ocorrem na vida em sociedade. A Sociologia envolve, portanto, o estudo dos grupos e dos fatos sociais, da divisão da so­ciedade em classes e camadas, da mobilidade social, dos processos de cooperação, compe­tição e conflito na sociedade etc.

Economia - Tem por objeto as atividades humanas ligadas à produção, circulação, dis­tribuição e consumo de bens e serviços. Por­tanto, são fenómenos estudados pela Econo­mia a distribuição da renda num país, a política salarial, a produtividade de uma empresa etc.

Antropologia - Estuda e pesquisa as se­melhanças e as diferenças culturais entre os vá­rios agrupamentos humanos, assim como a ori­gem e a evolução das culturas. Além de estudar a cultura dos povos pré-letrados, a Antropolo­gia ocupa-se também da diversidade cultural existente nas sociedades industriais. São objetos de estudo da Antropologia os tipos de or­ganização familiar, as religiões, a magia, os ri­tos de iniciação dos jovens, o casamento etc.

Ciência Política - Ocupa-se da distribui­ção de poder na sociedade, assim como da formação e do desenvolvimento das diversas formas de governo, É a Ciência Política que es­tuda, por exemplo, os partidos políticos, os me­canismos eleitorais etc.

Não existe uma divisão nítida entre essas disciplinas. Embora cada uma das Ciências Sociais esteja voltada preferencialmente para um aspecto da realidade social, elas são com­plementares entre si e atuam frequentemente juntas para explicar os complexos fenómenos da vida em sociedade.

Oliveira, P. S. de. FUNDAMENTOS SOCIOLÓGICOS. São Paulo: Ed. Ática, 2010, p. 92 e 93.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

A FILOSOFIA ANTIGA - PRÉ-SOCRÁTICOS.

A Filosofia antiga desenvolveu-se em quatro períodos:
- O Pré-Socrátíco (entre os anos 700 e 450 a.C. aproximadamente).
Este período começa com o surgimento de Tales de Mileto, considerado o pai de toda a Filosofia e Cultura Ocidental, e vai até o surgimento do famoso Sócrates de Atenas, o mais legendário e simbólico de todos os filósofos.
- O Clássico (entre 450 e 300 a.C. aproximadamente).
É o mais importante período da Filosofia antiga. Nele se desenvolveram teorias e obras muitíssimo estudadas em nossas universidades até os dias de hoje. Os principais filósofos deste período foram Sócrates de Atenas, Platão de Atenas e Aristóteles de Estagira.
Cabe ressaltar que este período é considerado o mais importante da Filosofia Antiga porque deu-se no apogeu da civilização grega, em particular na Atenas democrática.
- O Alexandrino ou Helenistíco (entre 300 a.C. e 200 d.C. aproximadamente).
Neste período destacaram-se os sucessores de Platão e Aristóteles, e também a Filosofia Estóica, a Epicurista e a Cética.
- O Greco-Romano (entre 200 e 530 d.C.).
Este período é caracterizado pelo surgimento da Filosofia cristã e a sua fusão com a Filosofia grega. Nele se destacam os filósofos Sêneca, Plotino, Hermes Trismegisto, Porfirio, Plutarco, Proclo e Simplício.
.
A ESCOLA JÔNICA.
Fugindo das invasões dóricas, os gregos de Micenas refagiaram-se no oeste da Ásia Menor, numa região denominada Jônia. Lá fundaram algumas cidades, dentre as quais se destacou Mileto. O desenvolvimento do comércio e a abundância do ouro fez com que lá surgissem grandes centros nos quais desenvolveu-se uma fértil atividade cultural. Foi na Jônia que nasceu a Filosofia.
Além da sua Filosofia, na qual se discutia principalmente a questão da mutabilidade da natureza, os Jônicos desenvolveram a Astronomia e a Matemática, em função de conhecimentos adquiridos de contatos com povos do Oriente.
.
TALES DE MILETO
Tales viveu entre os séculos VII e VI a.C., e, sobre a sua vida contam-se vários episódios.
Matemático e astrónomo, previu um eclipse solar que ocorreu no ano de 585 a.C.(?). Dizem que certa vez, distraído observando os astros, caiu num poço.
Enriqueceu devido às suas eximias habilidades de comerciante.
É considerado o "Pai da Filosofia e de toda a Cultura Ocidental".
Tales provavelmente nada escreveu. De sua Filosofia só restam os comentários sobre a mesma, de autoria dos filósofos posteriores (doxografia).
A matemática secundarista nos ensina o famoso "Teorema de Tales".
Segundo os seus comentadores, Tales afirmava que na natureza existia um único elemento primordial (a arché) a partir do qual tudo se origina; esta arché, para Tales seria a água.
A água encontra-se presente em tudo. Em todos os organismos vivos existe a umidade. Ao resfriar-se, a água se condensaria, dando origem à terra; ao aquecer-se tornaria-se ar que retornaria á terra em forma de chuva. Deste ciclo surgiria a vida animal e vegetal.
A própria Terra seria um disco que flutua sobre as águas.
Podemos perceber que as especulações pré-científicas de Tales parecem insuficientes para explicar a origem do Universo, porém deve-se considerar que Tales apenas iniciou uma busca que existe até hoje na construção do conhecimento.
.
HERÁCLITO DE ÉFESO
Heráclito viveu entre os anos de 536 e 470 a.C. na cidade de Éfeso, na região da Jônia.
De sua vida só se sabe que pertencia a uma família de aristocratas, e só não se tornou rei porque cedeu esta honra a seu irmão.
No período em que os persas dominaram Éfeso, o Imperador Dario I convidou Heráclito para transmitir-lhe os seus conhecimentos, dos quais pouco entendeu.
Heráclito ficou conhecido como "O Obscuro", pois escrevia de forma enigmática curtas frases (aforismos) de difícil entendimento.
Do seu livro "Sobre a Natureza", chegaram até nós pouquíssimos fragmentos, sobre os quais ainda restam dúvidas sobre sua autenticidade. Fora tais documentos, existem os comentários doxográficos.
Segundo Heráclito, a physis é regulada por uma única lei universal imutável - a lei do Logos - o princípio que se esconde por trás de todas coisas da natureza. Segundo a lei do Logos nada permanece, nada é eterno, tudo está em constante transformação, constante movimento.
A arché de Heráclito é o fogo. O fogo nunca está parado, as chamas estão em constante movimento. O fogo a tudo destrói; por um movimento descendente (condensação), as coisas afetadas pelo fogo tornam-se terra; por um movimento ascendente (rarefação) tomam-se ar; pela condensação do ar surge a agua que se evapora em contato com o fogo.
Na natureza nada é, tudo é um eterno fluir, um "vir-a-ser".
Heráclito formulou também a teoria da "Harmonia dos Contrários", a qual diz que o constante movimento das coisas se dá através de um combate das forças naturais contrárias entre si, um combate harmónico no qual se configura a lei do Logos.
.
A ESCOLA ELEATA.
No século VI a.C., os persas invadiram a Jônia. Fugindo dos persas, os Jônios da Foécia (ao norte de Mileto) fundaram a cidade de Eléia no sul da Itália.
Ao contrário da escola Jónica cujos filósofos afirmavam que a natureza é um imenso conjunto de forças contrarias em constante combate, os filósofos Eleatas afirmavam que é impossível que a natureza pudesse formar uma unidade através de forças contrárias, sendo absurda a transformação constante.
.
PARMÊNIDES DE ELÉIA.
Parmênides viveu entre os anos de 515 e 440 a.C.
Além de filósofo foi um grande político. Provavelmente teve contato com a seita dos Pitagóricos, cuja doutrina combateu posteriormente.
Escreveu um poema cujo titulo é “Sobre a Natureza”, onde expõe os princípios de sua Filosofia.
Algo que estaria em constante mudança seria algo contraditório consigo mesmo, não podendo portanto existir na natureza algo assim.
Tudo o que existe na natureza é único, eterno e imutável, sem variações.
Ao contrário das afirmações dos Jónicos, Parmênides negava o "vir-a-ser" de Heráclito, afirmando que "o ser é, e o não-ser não é; nada que não é ser jamais pode vir-a-ser", ou seja, na natureza nada muda, tudo é eterno, tudo permanece. Parmênides compara a natureza a uma esfera, que é uma totalidade completa em si própria na qual todas as partes equilibradamente possuem igual distância de seu centro.
Este pensamento, difícil de ser compreendido, lançou as bases da Metafísica (meta - além e physis- natureza). A metafísica seria então a parte abstrata das coisas, a sua essência, a qual não pode existir materialmente mas só em espirito (pensamento).
Ao contrário dos Jônicos que buscavam a arché que é um elemento material no qual estaria a origem da natureza, Parmênides não procurava este princípio na matéria. Por isto é considerado o primeiro metafísico da história da Filosofia.
O ser para Parmênides seria o próprio pensamento. Ser e pensar seria a mesma coisa. Além de estabelecer as bases da metafísica, Parmênides, ao estabelecer o "princípio de identidade" entre ser e pensamento, estabeleceu as bases da Lógica.
.
OUTROS FILÓSOFOS PRÉ-SOCRÁTICOS.
Não menos importantes que os filósofos descritos anteriormente, existiram outros grandes expoentes da Filosofia no período Pré-Socrático que foram:
ANAXIMANDRO DE MELETO (610 - 547 a.C.) - Jônico, sua arché seria o ápeiron - o indeterminado.
ANAXÍMENES DE MILETO (585 - 528(5) a.C.) - Também jônico, defendia que a arché seria o ar.
PITÁGORAS DE SAMOS (580(78) - 497(6) a.C.) - A ele é atribuída a invenção da palavra Filosofia, amante da sabedoria. A escola por ele fundada (a Pitagórica) assumiu características de seita mística secreta. A ele é atribuída a elaboração do famoso "Teorema de Pitágoras".
A Escola Pitagórica é uma das mais importantes de toda a história da Filosofia.
Para os Pitagóricos, o número seria a essência do todo existente.
ANAXÁGORAS DE CLAZÔMENAS (500 - 428 a.C.) - Afirmava que o voua (nous -espírito ou inteligência) é a origem do movimento e da pluralidade, sendo a natureza composta não por uma arché, ou por quatro elementos, mas por incontáveis elementos.
DEMÓCRITO DE ABDERA (460 - 370 a.C.) - Desenvolveu a teoria atomista, que é fundamental até os dias de hoje para a química. Nela afirmava que a matéria é composta por infinitas partículas não divisíveis, e que tais partículas chamavam-se aiofioo (átomos -indivisíveis).
LEUCIPO DE MILETO (500 - ? a.C.) - Mestre de Demócrito, lançou as bases da teoria atomista.
MELISSO DE SAMOS (444(1) - ? a.C.) - Foi defensor das teorias eleáticas.
FILOLAU DE CROTONA (séc. V a.C.) - Um dos maiores pitagóricos, foi mestre de Demócrito e Arquitas. studou a matemática acima de tudo, concebendo a entidade abstraía da matemática - o numero - como a chave de explicação do Universo.
ZENON DE ELÉIA (504(1) - ? a.C.) - Discípulo de Parmênides, formulou o curioso paradoxo de "Aquiles e a Tartaruga", pelo qual nega as teorias jónicas do movimento constante da natureza.
EMPÉDOCLES DE AGRIGENTO (490 - 435 a.C.) - Procurou fazer uma fusão das teorias jônicas com as eleáticas. Segundo Empédocles, a natureza é composta por quatro elementos: água, ar, terra e fogo, sendo o ser eterno e indivisível, mas não imóvel.
ARQUITAS DE TARENTO (400 - 365 a.C.) - Grande pitagórico, acredita-se ter sido o fundador da mecânica cientifica. Foi amigo de Platão.
XENÓFANES DE COLOFÃO (570 - 528 a.C.) - Viveu em diversas cidades gregas, e parece ter tido afinidade com as teorias eleatas, o que é duvidoso. Foi crítico de Tales e de Pitágoras.

Por Douglas Gregorio.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

MITO E FILOSOFIA.

A PASSAGEM DO PENSAMENTO MÍTICO PARA O FILOSÓFICO

Um dos modos talvez mais simples e menos polêmicos de se caracterizar a filosofia é através de sua historia - forma de pensamento que nasce na Grécia antiga, por volta do séc. VI a.C. [...]

Se afirmamos que o conhecimento científico, de cuja tradição somos herdeiros, surge na Grécia por volta do séc. VI a.C., nosso primeiro passo deverá ser procurar entender porque se considera que esse novo tipo de pensamento aparece aí pela primeira vez e o que significa essa “ciência” cujo surgimento coincide coma a emergência do pensamento filosófico.

Quando dizemos que o pensamento filosófico-científico surge nana Grécia, caracterizando-o como uma forma especifica de o homem tentar entender o mundo que o cerca, isto não quer dizer que anteriormente não houvesse também outras formas de se entender essa realidade. É precisamente a especificidade do pensamento filosófico-científico que tentaremos explicitar aqui, contrastando-o com o pensamento mítico que lhe antecede na cultura grega. Procuraremos destacar as características de uma e de outra forma de explicação do real.

O pensamento mítico consiste em uma forma pela qual um povo explica aspectos essenciais da realidade em que vive: a origem do mundo, o funcionamento da natureza e dos processos naturais e as origens deste povo deste povo, bem como seus valores básicos. O mito caracteriza-se, sobretudo pelo modo como estas explicações são dadas, ou seja, pelo tipo de discurso que constitui. O próprio termo grego mythos significa um tipo bastante especial de discurso, o discurso fictício ou imaginário, sendo por vezes até mesmo sinônimo de “mentira”. [...]

Por ser parte de uma tradição cultural, o mito configura assim a própria visão de mundo dos indivíduos, a sua maneira mesmo de vivencia esta realidade. Nesse sentido, o pensamento mítico pressupõe a adesão, aceitação dos individuas, na medida em que constitui as formas de sua experiência do real. O mito não se justifica, não se fundamenta, portanto, nem se presta ao questionamento, à crítica ou à correção. Não há discussão do mito porque ele constitui a própria visão de mundo dos indivíduos pertencentes a uma determinada sociedade, tendo, portanto um caráter global que exclui outras perspectivas a partir das quais ele poderia ser discutido. [...]

Um dos elementos centrais do pensamento mítico e de sua forma de explicar a realidade é o apelo ao sobrenatural, ao mistério, ao sagrado, à magia. As causas dos fenômenos naturais, aquilo que acontece aos homens, tudo é governado por uma realidade exterior ao mundo humano e natural, superior, misteriosa, divina, a qual só os sacerdotes, os magos, os iniciados, são capazes de interpretar, ainda que apenas parcialmente. [...]

É Aristóteles... que afirma ser Tales de Mileto, no séc. VI a.C., o iniciador do pensamento filosófico-científico. Podemos considerar que este pensamento nasce basicamente de uma insatisfação como o tipo de explicação do real que encontramos no pensamento mítico. De fato, desse ponto de vista, o pensamento mítico tem uma característica até certo ponto paradoxal. Se, por um lado, pretende fornecer uma explicação da realidade, por outro lado, recorre nessa explicação ao mistério e ao sobrenatural, ou seja, exatamente àquilo que não se pode explicar, que não se pode compreender por estar fora do plano da compreensão humana.

É nesse sentido que a tentativa dos primeiros filósofos será de buscar uma explicação do mundo natural (a physis, daí o nosso termo “física”) baseada essencialmente em causas naturais... A chave de explicação do mundo de nossa experiência estaria então, para esses pensadores. No próprio mundo, e não fora dele, em alguma realidade misteriosa e inacessível.

O pensamento filosófico-científico representa assim uma ruptura bastante radical com o pensamento mítico, enquanto forma de explicar a realidade.

Entretanto, se o pensamento filosófico-científico surge pro volta do séc. VI a.C., essa ruptura com o pensamento mítico não se dá de forma completa e imediata. Ou seja, o surgimento desse novo tipo de explicação não significa o desaparecimento por completo do mito, do qual alas sobrevivem muitos elementos mesmo em nossa sociedade contemporânea, em nossas crenças, superstições, fantasias, etc., isto é, em nosso imaginário. O mito sobrevive ainda que vá progressivamente mudando de função, passando a ser antes parte da tradição cultural do provo grego do que a forma básica de explicação da realidade. [...]

É claro que essa mudança de papel do pensamento mítico, bem como a perda de seu poder explicativo resultam de um longo período de transição e de transformação da própria sociedade grega, que tornam possível o surgimento do pensamento filosófico-científico no séc. VI a.C. O pensamento mítico, com seu apelo ao sobrenatural e aos mistérios, vai assim deixando de satisfazer as necessidades da nova organização social, mais preocupada com a realidade concreta, com a atividade política mais intensa e com as trocas comerciais. É nesse contexto que o pensamento filosófico-científico encontrará as condições favoráveis para seu nascimento. [...]

O caráter global, absoluto, da explicação mítica teria se enfraquecido no confronto entre os diferentes mitos e tradições, revelando-se assim sua origem cultura: o fato de que cada povo tem sua forma de ver o mundo, suas tradições e seus valores. Ao mesmo tempo, em uma sociedade dedicada as praticas comerciais e aos interesses pragmáticos, as tradições míticas e religiosas vão perdendo progressivamente sua importância. Esta é uma hipótese que parece razoável, de um ponto de vista histórico e sociológico, e mesmo geográfico e econômico, para a explicação do surgimento do tipo de pensamento inaugurado pro Tales e pela chamada Escola de Mileto, naquele momento e naquele contexto.

           

MARCONDES, Danilo. Iniciação à História de Filosofia. Dos Pré-socráticos a Wittgensteisn. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002. 7ª Edição.